Homens&Pássaros

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Sexta-feira, 30 / 09 / 11

Sonhos

São tantos os sonhos
mas os preços são tantos
que aqui estou com você
nesta cidade sem nome
nesta cidade sem rosto
nestas ruas com gente
sem roupas, sem dentes, sonhos
pagando preços que vão
da orla suja do mar
ao leito seco do rio
do gosto amargo da fruta
ao cheiro podre do lixo
do fundo frio do bolso
aos tristes olhos sem brilho
do magro rosto do cão
ao feio corpo dos filhos.

Aqui estou com você
pagando tão pouco por isso
que sinto no rosto a vergonha
de por isso ficar triste
nesta cidade sem nome
nesta cidade sem rosto
nesta cidade sem sonhos
nesta cidade sem homens
nesta cidade sem vida
nesta cidade que é preço
nesta cidade que é víscera
nesta cidade sem corpo
nesta cidade agonia.
Recife/Pe

publicado por Antonio Medeiro às 15:30
Terça-feira, 06 / 07 / 10

Elegia do amor profano

Para Milena, Amanita, Inã, Amana e Nayê, filhos

De quem serão as crianças
que fazemos sem pensar?
E as que foram feitas
com nossa atenção dobrada
a leve mão na barriga
a doce voz pelos poros
aquela espera sentida...
o aflito contar das horas?

De quem serão as crianças
as pensadas, não pensadas?
Da rosa, cores, perfumes
bicos, pólen, vento...asas
espuma rondando a praia
azul lambendo o mormaço
gritinhos, olhos, desenhos
vida, arrepio...graça
campos de lantejoulas
matas, riachos, praças
cantiga de beija-flores
nuvens, chuva... fumaça?

De quem serão as crianças
as sonhadas, não sonhadas?
Das muitas, pobres partilhas
invasões, saques, ardis
eterna, vil armadilha
de sermos tão pueris
sozinhos, mudos, perdidos
consumido, mergulhados
no negro mangue dos dias
no frágil tic das horas
no seco som das palavras
no fundo poço dos olhos
na lenda viva, obscura...
nosso vulto na aurora?

De quem serão as crianças
as amadas, não amadas?
Das migalhas de um sono
não dormido, amamentado
no reles desejo de ira
violências, desagravos
no fino mel do veneno
faca...honra aviltada
no verde grão da inocência
humo...fome plantada
nas rudes, cegas verdades
dos levianos retratos
dos velhos, vagos anseios
pobres sonhos calados
na fria, tola permuta
a mesma face pintada
o mesmo sono invencível
vida, morte acuadas
desenhos, sons, aparências...
nosso próprio cansaço?

De quem serão as crianças
as cansadas, não cansadas?
Do gosto amargo da língua
das palavras malfaladas
do olhar fero, terrível
dos amores degolados
no eterno, doído medo
punhal... sentença talhada
na vida estéril, inerte
dos casais mal-acabados?

Serão de circo as crianças
plumas, vedetes, palhaços?
Mansos leões afagando mãos
chicote... o mágico
estranha plateia, cantigas
serenas formas aladas
aplausos, grito...delírio
o bis fluindo dos lábios
alma, corpo, destino
escadas do cadafalso
punhos, força, instinto
silêncio, reza... carrasco
rito, cenas, algemas
vaias, forca... sarcasmos
débeis flores nascendo
quietude, corte... mais nada?

De quem serão as crianças?
Do fato ou do nosso ato
de sermos todas as horas
um equilíbrio em farrapos
um pequenino retrato vazio
sem fundo... face
imagem nua... disforme
do amor carente de ordem
amor passível de morte
que veio, pousou nos olhos
teceu lampejos de posse
roeu cantigas serenas
comeu a linfa da vida
roubou a fé tão pequena
plantou sementes de ódio
tingiu o mel com veneno
torceu a linha dos sonhos
traçou o fio da sentença
forçando garganta abaixo
a sina dos mil dilemas?

De quem serão as crianças
as cantadas, não cantadas?
Do nosso parvo delírio
restos de dores guardadas
no rosto sério, ferido
nos olhos fitos, sem água?

Serão do crime as crianças
milhões de crimes da raça?
Dos vinte crimes de frases
de um só crime, a palavra
do crime acalentado
por nossa voz afiada
o frouxo corpo encolhido
as frágeis mãos calejadas
o cego gosto da posse
o couro cru da chibata
a vaga calma perdida
nessa triste, vil trapaça
de sermos feitos de alma
de vergonhas, de migalhas
de rotas pedras caídas
nas ruínas de uma praça
de honra, status, pompas
que não servem para nada?

De quem serão as crianças
as honradas, não honradas?
Do sujo, medonho espólio
herança sempre macabra
de quem nessa vida mata
com beijos o objeto amado?

Serão nossas as crianças
pernas, pâncreas, cada abraço
choros, birras, artes, manhas
risos, sonhos, pés, trapaças?
O voo de cada dia
a vida presa no laço
a plena vida escondida
vingança, neuro, disfarce
selada com sete chaves
ciúmes, medo, maldade
eleita, em coro, no escuro
pra servir de cambalacho?

Serão nossas as crianças
produzidas pras idades
ou serão como nós próprios
prisioneiras desse nada?

De quem serão as crianças
as que ficam, não ficaram?
Da fosca prata da lua
do seco pó das estradas
dos andaimes de concreto
das obras não terminadas
da fina imagem do vidro
dos olhos semicerrados
dos fundos sulcos, das rugas
pintura...rosto marcado
por esse suicídio lento
resíduo... vida calada
o nada - fuga impossível
essa agonia pirata
que ronda com suas espadas
o nosso peito de lata?

Serão do tempo as crianças
lábios, seios inchados
na cólica negra da noite
o canto desesperado
da fome - ave do vento
leite, no ego, estragado
por tanto sim escondido
por tantos beijos negados?

De quem serão as crianças
as beijadas, não beijadas?
Do nosso gostoso abraço
daquela velha amizade
do leve toque de pele
o livre canto sem hora
de tudo que prometemos
bonecas, parques e palmas
por tudo que lhes passamos
angústias, gritos e tapas?

De quem serão as crianças
com seus olhinhos sensatos
suas mãozinhas serenas
seus rostinhos alados?

Do curso longo, violento
das vidas atormentadas
dos vagos, duros rancores
de algum amor enfadado
desse olhar indescritível
dos adultos retalhados?

Serão de fato e direito
divisíveis, partilháveis
serão unguentos possíveis
pros nossos cortes baratos
pros nossos pequenos traumas
pra eterna falta de tato?

Serão nossas as crianças
as com marcas, não marcadas?
Ou desse medonho poço
vida, sonhos aprisionados
na rasa, pura mentira
essa sentença calada
de sermos filhos que somos
aflitos pais não lembrados
antiga fome contida
no peito - órgão gelado
por nosso fel escondido
no estranho mundo da alma?

Serão nossas as crianças
as faladas, não faladas?
Ou serão do mesmo barro:
filhos, pais, velhos, casais
gritos, medo, desatino
o silêncio... nada mais!

publicado por Antonio Medeiro às 10:13
Terça-feira, 23 / 03 / 10

Carta ao meu filho

Meu filho:

Quando você começou a sair da minha vida, preparado eu estava para perder um braço, uma víscera, um pedaço do coração.

Preparado eu não estava para ficar sozinho com o meu egoísmo.

Poderia te dizer que te acompanhei na barriga.

Que te vi nascer.

Engatinhar.

Andar.

Murmurar 'pai' pela primeira vez.

Adoecer.

Crescer.

Ir pra escola.

Se tornar um moço.

Um homem.

Poderia dizer que te amo e que você é uma das coisas mais importantes da minha vida.

Que você é algo muito bom para o meu ego.

Poderia dizer que, mesmo ao te ver exercitando a tua rebeldia e teu, às vezes, difícil comportamento, ainda assim te olho com orgulho e esperança.

Como se fosse a extensão da minha vida, lá na frente... no futuro distante.

Poderia dizer que você sempre, com teu carisma e simpatia, arrebatou o coração de muitas pessoas e, principalmente, de um pai.

Que você, desde que nasceu, nasceu fadado a ser um menino, um moço, um homem de boa índole e de boas coisas.

Poderia dizer que você, embora adulto, ainda cheira ao leite materno e não passa, para mim, de um menino meio desatento no meio da selva perversa da juventude.

Que o meu sonho de te ver feliz, saudável e bem localizado, no mundo de loucos, é apenas o desespero de um pai apaixonado pelo filho.

Poderia dizer que eu, como quase todos os pais, cometi os meus erros, os meus excessos, as minhas faltas e ausências e, principalmente, longas omissões em relação ao andamento da tua vida longe do convívio de casa.

O que, de uma maneira ou outra, concorde eu ou não, acaba justificando parte das tuas atitudes, parte do caminho que você passou a caminhar em busca do que você julga importante para a tua vida.

Poderia te dizer que eu deveria ser extremamente duro com você - gritar, berrar, urrar nos teus ouvidos, te colocar numa cama de pregos - para te fazer trilhar, à força, os rumos que eu pretensiosamente julgo ser os corretos para você.

Que os meios justificam os fins e pronto!

Poderia te dizer muitas coisas, muitas palavras, elogios, críticas, confessar coisas inconfessas, te dizer que te amo mil vezes.

Que somente o amor é capaz de redirecionar vidas para os horizontes perfeitos.

Mas não vou fazer isto.

Gostaria apenas, como muitas vezes fiz, de te olhar dormindo na segurança das minhas asas, passar as mãos pelos teus cabelos, arrumar o cobertor sobre você e ficar novamente ali - feito bobo - me derretendo de orgulho por você existir, por você fazer parte da minha vida.

Gostaria apenas que você repensasse a tua vida e, como uma fênix renascida das cinzas, se envolvesse nos meus braços e ficasse em paz na convivência da tua família.

Um beijo!

Um abraço!

Obrigado por você existir!

publicado por Antonio Medeiro às 08:25
Quarta-feira, 13 / 01 / 10

Os meus filhos

Confesso... sou um pai de coração angustiado!

Não existe uma só madrugada que eu não acorde e não pense nos meus filhos.

Nos mais velhos, nos mais novos, nos solteiros, nos casados, nos distantes, nos pertos.

Uma angústia nada fácil de sentir... uma agonia secreta!

Empregos, esposas, maridos, escola, saúde, vícios... futuro!

Futuro num momento difícil da humanidade: incerteza, violência, doenças, carestia, isolamento, solidão... individualismo.

Projeto-os no futuro distante e fico temeroso, pesaroso... agoniado com suas vidas naquele tempo futuro.

São tão jovens!

Tão ingênuos!

Tão alimentados por esta farsa que é a promessa de que um dia vão conseguir o castelo!

O alazão de asas douradas!

Os seus filhos nos enormes jardins da esperança!

A eterna felicidade!

Eu envelheço!

Mas meus filhos serão sempre crianças!

Expostos à dureza da vida!

À maldade humana!

Às suas próprias fantasias!

Às suas próprias armadilhas!

O mundo escraviza os fortes e engole os fracos... é a lei da selva!

Quando, à noite, viajo pelos tempos futuros e os vejo, ora sorridentes, ora tristes, ora na opulência, ora na falta, lutando desesperadamente para serem felizes, por um momento de paz... o meu coração sangra.

Porque não há nada que eu possa fazer!

Primeiro, porque realmente eu não sei o que fazer para protegê-los do mundo - muita gente acha que sabe - se souberem, por favor me ensinem!

Segundo, porque eles próprios têm sua própria visão das coisas.

Eu mesmo contribuí para isto, e não há nada no mundo que os faça mudar de ideia!

E eles, sinceramente, na maioria das vezes, nem sabem que ideia é esta!

Mas não se preocupem, é só a angústia de um pai!

Às vezes pareço distante, ausente, omisso em relação aos meus filhos.

Mas é só porque, talvez, nunca prestaram muita atenção no meu coração.

É só o coração de um velho pai que sangra angustiado, em silêncio, na solidão da noite.

Chorando pelos seus filhos, junto com eles, as suas perdas e dores... coisas que ainda vão acontecer.

O amor e a paixão... por medo, às vezes são secretos.

E coração de pai, tanto quanto o de mãe, também dói!

Vou descobrindo isto aos poucos!

.
TõeRoberto

publicado por Antonio Medeiro às 05:00
Quinta-feira, 01 / 01 / 09

2009 E VOCÊ

Textos Escolhidos

 

Este ano:

Não procure a beleza nas estrelas
a felicidade em seus filhos
a esperança nas palavras
o afeto em seu cão.
 
Não procure o sentido na poesia
as aventuras nas marés
a paz nas bandeiras brancas
a sua vida em minhas mãos.

 

Não procure a doçura nos sorrisos
a felicidade nas manhãs
os romances nos luares
o amor em meu coração.
 
Este ano faça diferente!

Procure em VOCÊ!

Olhe para VOCÊ!

Sinta VOCÊ!

Escute VOCÊ!

Mergulhe fundo no SEU âmago, lá onde está VOCÊ.

Entre no profundo de VOCÊ!

VOCÊ é grande!

Garimpe o V o O o C o E e o ^.

Traga-OS à superfície da SUA vida.

Agarre-OS!

Dome-OS!

Ame-OS!

Faça-OS brilhar!

Mostre ao mundo como VOCÊ brilha!

Brilhe e entenda: VOCÊ é a única pessoa no mundo capaz de fazê-LO pleno de verdade.

VOCÊ e mais ninguém! 
Amor, paixão, tesão, paz, alegria, felicidade, esperança, beleza, sentido, afeto e todo o resto são meras conseqüências da SUA plenitude.

Experimente!

BRILHE EM 2009 E VIVA FELIZ!
.
TõeRoberto-01:08-post in jampa/pb

música: Um Novo Tempo - Orquestra Som Livre
publicado por Antonio Medeiro às 06:43
Domingo, 09 / 11 / 08

O PEDIDO II

Poemas Escolhidos

 

Não rabisquem meu nome pelos muros
nem desenhem meu rosto nas fachadas
nada fiz pelos homens e seus filhos
nem cumpri o ritual dos iluminados.

 

Eu só quero que me matem e me esqueçam
numa rua qualquer desta cidade
onde um bêbado, uma noite, me encontre
e me eternize ao soltar sua gargalhada
.
.
(Fonte: Poema - Autoria de TõeRoberto)
Post in Jampa/PB

música: Esquinas - Djavan
publicado por Antonio Medeiro às 05:42
Blog de TõeRoberto

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