Textos Escolhidos
Era uma vez um cara muito bonitinho, muito queridinho que por ter dois braços, duas pernas, dois olhos, duas orelhas, um nariz, uma boca sorridente, etc; digo, ter todo o corpo em perfeito funcionamento, era chamado de João-Sem-Braços.
Ele, como todo bon vivant do interior, era muito conhecido e muito vivo em questões financeiras, porém não vivia contente com tudo que tinha e fazia, porque o que queria mesmo era se tornar político.
Então procurou um amigo:
Ô, compadre!, queria uma informaçãozinha!
Pois não! - disse o compadre.
Que faço pra sê político?
Ora, compadre, é muito fácil! - respondeu o outro. Basta que você comece a falar de política nos bares e que, nas eleições que se aproximam, apóie um dos partidos, que o dinheiro e a sua cara amiga garantem o resto.
Assim fez João-Sem-Braços.
Depois de dois anos era um grande politicozinho.
Fazia comícios com dois S. Prometia asfalto com U. Pedia apoio com H. Criava comissão com Ç.
Assim foi.
O tempo passou e João-Sem-Braços tornou-se um líder imbatível na política da cidadezinha, isto, apoiado por todos os outros grandes politicozinhos.
João-Sem-Braços, como os outros, além de fazer política, fazia também intrigas, que era a arma secreta dos partidos.
"E a administração?" - perguntavam de fora.
Que nada! João-Sem-Braços, como os outros, erguia o peito na rua como a dizer: "sou o dono desta m... e não aceito opinião!"
João-Sem-Braços, como os outros, era muito corajoso, isto era.
Em época de eleição municipal metia a máscara número cinquenta e nove e adquiria a ousadia de bater na porta da casa da gente para pedir votos.
E dizia:
Bom-dia, gente boa! Sô do partido tar, coisa e tar, e quero mostrá proceis a vantage de votá na gente.
E mostrava mesmo, como se fosse vendedor de produtos Avon. Não respeitava nem mesmo a capacidade de pensar de quem votava. Às vezes, enfiava a mão no bolso (isso quando percebia que a casa era de chão batido ou pau-a-pique) e oferecia o l'argent ao pobre coitado que, ao ver a verminose dos filhos, mais que depressa pegava e jurava devoção completa ao partido.
E era assim por diante: de casa em casa, de bolso em bolso, de sorriso em sorriso.
Como sempre acontecia, João-Sem-Braços, como os outros, vencia a eleição, porém, como era de praxe, não fazia, ou melhor, não tinha condições de fazer nada de proveitoso, a não ser intrigas e mais intrigas.
No meio do povo aqueles que não estavam envolvidos na política e que deveriam estar porque entendiam um pouco mais das coisas, estavam descontentes com a imensa séria de João-Sem-Braços que vinha tomando conta das coisas e já não acreditavam tanto no seu dinheiro e na sua carinha amiga.
Um dia, um amigo mais atrevido procurou-o e disse:
Ô compadre!, queria lhe pedir uma coisa.
Pois peça, compadre!
- Por que você não volta a ser o que era antes?, coisa e tal, tal e coisa, digo, por que não deixa de ser político?
Não aceitou. Ficou ofendido com o amigo atrevido e na reunião da Câmara comentou com os outros politicozinhos:
O povo num tá contente!
O povo não entende nada! - respondeu um deles. Toque o barco, compadre, senão ele vira e a gente se afoga.
João-Sem-Braços que por esta passagem chata de sua vida, quase abandonou a política, ainda hoje está dentro dela fazendo promessas com Ç, administrando com I, projetando com G, tudo dentro de sua grande ingenuidade com J.
Esta é a história de um politicozinho de interior que, com raríssimas exceções, é um verdadeiro "Político Colonial", na acepção de minha modesta palavra, pois outro dia na rua, ouvi um comentário de um dos Joãos-Sem-Braços que muito me comoveu:
Ô compadre!, a política tá me embruiano o estamo!
Por que compadre?
Magina o compadre que arguém tá quereno botá posição!
Oposição, compadre!... Oposição!
É... é isso mesmo! Mas num tem nada não! Já tenho meu gorpe preparado pra esse ano!
Fiquei a rir e saí de perto com medo de que toda aquela doença com dois S me pegasse com Ç, pois fiquem os leitores sabendo com C que João-Sem-Braços com S é a coisa com Z mais contagiosa com J que existe com Z dentro das Câmaras.
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TõeRoberto-11:14-post in jampa/pb