Textos Escolhidos
A memória é algo formidável.
Esconde tesouros, crimes, vergonhas, coragens... todo nosso passado.
Na rua, hoje, a música:
"Abre a janela, querida
venha ver o luar cor de prata
venha ouvir o som desse meu pinho
na canção de uma serenata..."
Antiga, Pedro Bento e Zé da Estrada.
Meu pai - 'Seu Neguinho' - a amava.
Junto à lembrança de Seu Neguinho me veio os bailes da Gonçalvina - "Gonçarvina" para os mineiros.
A Casa do "João da Gonçarvina", aos sábados, era o point dos boêmios, músicos, mulherengos, farristas e dançarinos.
Uma casa humilde, uma família humilde, um baile. Não era prostíbulo, era só um baile!
Eu, criança, me lembro!
Na madrugada silenciosa do interior a música viajava serena.
03 da manhã acordava: o som do cavaquinho e a voz de Seu Neguinho flutuavam no vento da noite.
A música:
"Abre a janela, querida
venha ver..."
A minha mãe, irrequieta.
Somente aos sábados: um único momento de paz e alegria para pessoas que carregam o mundo nas costas.
Seu Neguinho se foi: não era mulherengo. Apenas um homem solitário e sensível.
Analfabeto nas letras e letrado na sensibilidade.
Um poeta da noite!
Tomava suas cachaças, tocava seu cavaquinho e cantava suas canções para suportar o mundo e o seu trabalho duro.
Fui entendê-lo há pouco tempo. Fiquei com vergonha da minha demorada ignorância.
Era um homem e seu universo limitado e voraz. Um homem de peles!...
"Sei que dormes sonhando com outro
desprezando quem é o teu amor
quem tu amas de ti nem se lembra
quem te quer você não dá valor..."
Uma lágrima!...
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TõeRoberto-post in jampa/pb